O Valor do Amanhã – Eduardo Giannetti

Uma das características que diferencia o Ser Humano dos outros animais é a sua capacidade de romper a barreira do tempo. Mas em que sentido? No sentido de que temos a habilidade de programar a nossa existência no cenário do tempo, estimá-la com as nossas visões de futuro e planejar o tempo vindouro antes que já tenha se convertido em presente.

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Pois o livro de Eduardo Giannette explora com muita habilidade e concisão esse tema importante através de um histórico biológico (o estabelecimento da senescência nos animais vem a ser um escolha feita pela natureza, aproveite agora, desconte depois, gerando na juventude o máximo desempenho do corpo, e com o tempo a falência dos órgãos, muito prudente numa terra primitiva repleta de ameaças por toda a parte), enveredando pelas raízes sociais (desde o pensamento burguês ao escravocrata) findando nas consequências econômicas, tendo num único termo o resumo do livro: JUROS.  O livro é sobre juros, em suas várias manifestações na vida, e não somente na economia.

Por vezes tendo uma forma de narrar um pouco prolixa, cheia de citações à pensadores, economistas, poetas e músicos, a leitura acaba se revelando não tão complicada quanto possa parecer, mas exige atenção e digo que, pela visão que defende, vale a pena ler.

O Gene Egoísta – Richard Dawkins

Apesar das más interpretações que o título pode sugerir com o emprego da palavra egoísta, o autor Richard Dawkins traça aqui muitas respostas para perguntas fundamentais sobre a natureza dos seres vivos multicelulares. Uma das principais é a de como seres inicialmente provenientes de uma única célula vieram a se tornar formações de conglomerados dessas entidades. Ou mesmo, tendo num filamento de DNA a unidade replicante, como esta veio a formar a estrutura celular conhecida, e desta, a multiplicidade de organismos que povoam o nosso planeta?

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Unicamente propondo a ideia do gene replicante, ou gene imortal, o gene egoísta que dá nome à obra, e partindo deste raciocínio para que pensemos todo o comportamento animal individual e em grupos (primeiro o que é bom para o gene, para a sua perpetuação, não para o indivíduo ou para o organismo), Dawkins abre caminho para possíveis respostas. Se for mais seguro para o gene estar agrupado com outros genes em um “casulo funcional”, comando sua síntese toda vez que se replicaram, por que não o fariam, e por que a seleção natural não lhes favoreceria? Pois não seria mais fácil uma concatenação de “casulos”, cada qual especializado em determinado função, dentro do microcosmo de um organismo ainda maior? Pois a seleção natural não favoreceria esse tipo de mutação? Que tal uma bactéria que viesse a se especializar em alguma função dentro do organismo, como a síntese de alguma proteína útil, e que tivesse igualmente interesse e meios de se reproduzir pelo mesmo canal, ou “gargalo”, que esse organismo maior se reproduz? Essa bactéria não poderia ser incorporada ao indivíduo, sem que possamos habilmente distinguir entre dois organismos distintos após alguma geração?

Pois estas são algumas ideias interessantes que tomam forma nesta fascinante leitura do autor de “Deus, um delírio”. Pois, para bem compreender as nuances que permeiam os conceitos usados por Dawkins, se faz obrigatório o conhecimento básico de biologia (se você não sabe quem é Darwin e a sua contribuição para a ciência, nem toque em “O Gene Egoísta”), algumas noções de estatística e muita mente aberta, a fim de não deixar de apreciar a leitura por falta de referências ou mesmo preconceitos. Tive contato com a tradução de Rejane Rubino, publicada pela Companhia Das Letras, em edição revista e atualizada publicada em 2013.

Contato – Carl Sagan

O meu livro favorito do falecido professor de astronomia Carl Sagan é “Contato”. Seu primeiro e único romance, tem como enredo a fascinante história sobre a busca de inteligência fora da Terra, contando com realistas relatos de como tal descoberta se configuraria no imaginário humano moderno.

A história é protagonizada por Ellie Arroway, uma jovem que desde cedo ficou órfão do pai. Sendo cientista, dedica sua vida à busca de contato com seres inteligentes no universo através de radiotelescópio. Entretanto, o trabalho de Ellie é comprometido pela falta de credibilidade com os demais cientistas, governo e investidores, os quais não vêem aplicação prática em seu trabalho. Porém Ellie descobre um sinal supostamente vindo das proximidades da estrela Vega, sinal este que, uma vez decifrado, revelou-se sendo um projeto de construção de uma espécie de máquina que conduziria um grupo de seres humanos para Vega. Além de contar com uma protagonista que inspira admiração pela complexidade que Sagan a relata, eu diria, do modo quase autobiográfico, com a dura perda do pai, difícil relacionamento com a mãe e padrasto, dificuldade com relacionamentos amorosos, intelecto aguçado, enfim. Não que Sagan apresentasse todas as características citadas, mas a maneira como a ciência instiga intelectualmente a personagem, sem dúvida, é reflexo de anos de experiência na área e que só pode ser transmitido por um profissional dedicado e dotado de profundo respeito pela profissão. Mas Contato também é a oportunidade de confrontar argumentos céticos e religiosos de maneira hábil, reconhecendo que nem um nem outro é capaz de contemplar o Universo plenamente, mesmo sabendo que um o faz melhor que outro, que a análise científica conduz resultados mais palpáveis e mesmo mais importantes para a humanidade. A ciência é consagrada e devidamente valoriza pela pessoa que mais lutou para que fosse amplamente difundida. Mas a fé também recebe o seu valor fundamental na história de Sagan, e mesmo quando um pastor de grande apelo ao público e dotado de sinceras boas intenções reconhece incapaz de responder a dadas perguntas científicas, constatamos o quanto sua crença é mais de explanação subjetiva e menos de explicação do todo. Não perde o seu mérito de poder representar um apelo positivo, mas nunca poderá tomar o lugar da ciência na visão de mundo que esta conduz. Mas fé e ceticismo se confundem nessa singular história, quando o contato se estabelece a minúcia com que a situação é relatada e esmiuçada não é menos que memorável. O apelo emocional que estabelece também é um dos pontos altos, eu diria a principal lição que Sagan deixa de herança aos que seguem até o final de seu enredo rico em detalhes.

Divulgação da ciência, apresentação do ceticismo científico aplicado na vida, emocionante relato sobre a condição humana, enfim, todos esses conceitos se aplicam ao livro de Carl Sagan, que merece ser redescoberto em uma época que clama por um maior contato com a leitura e, principalmente, com o pensar cético.

 

 

 

 

Contato – Carl Sagan – Contém Spoilers

O meu livro favorito do falecido professor de astronomia Carl Sagan é “Contato”. Seu primeiro e único romance, tem como enredo a fascinante história sobre a busca de inteligência fora da Terra, contando com realistas relatos de como tal descoberta se configuraria no imaginário humano moderno.

A história é protagonizada por Ellie Arroway, uma jovem que desde cedo ficou órfão do pai. Sendo cientista, dedica sua vida à busca de contato com seres inteligentes no universo através de radiotelescópio. Entretanto, o trabalho de Ellie é comprometido pela falta de credibilidade com os demais cientistas, governo e investidores, os quais não vêem aplicação prática em seu trabalho. Porém Ellie descobre um sinal supostamente vindo das proximidades da estrela Vega, sinal este que, uma vez decifrado, revelou-se sendo um projeto de construção de uma espécie de máquina que conduziria um grupo de seres humanos para Vega. Além de contar com uma protagonista que inspira admiração pela complexidade que Sagan a caracteriza, eu diria, como um alter ego seu, com a dura perda do pai, difícil relacionamento com a mãe e padrasto, dificuldade com relacionamentos amorosos e intelecto aguçado. Não que Sagan apresentasse todas as características citadas, mas a maneira como a ciência instiga intelectualmente a personagem, sem dúvida, é reflexo de anos de experiência na área e que só pode ser transmitido por um profissional apaixonado pela profissão. Mas Contato também é a oportunidade de confrontar argumentos céticos e religiosos de maneira hábil, reconhecendo que nem um nem outro é capaz de contemplar o a suposta verdade plenamente. A ciência é celebrada aqui e devidamente valorizada pela pessoa que mais lutou para que fosse amplamente difundida. Mas a fé também recebe o seu valor fundamental na história de Sagan, e mesmo quando um pastor de grande apelo ao público e dotado de sinceras boas intenções se reconhece incapaz de responder a dadas perguntas científicas, constatamos o quanto sua crença é mais de explanação subjetiva e menos de explicação material do todo. Não perde o seu mérito, mas nunca poderá tomar o lugar da ciência na visão de mundo que esta conduz. Mas fé e ceticismo se confundem nessa singular história, quando o contato se estabelece. A minúcia com que a situação é relatada e esmiuçada não é menos que memorável. O apelo emocional construído também é um dos pontos altos, eu diria a principal lição que Sagan deixa aos que seguem até o final da leitura.

Divulgação da ciência, apresentação do ceticismo científico aplicado na vida, emocionante relato sobre a condição humana, todos esses conceitos se aplicam ao livro de Carl Sagan, que merece ser redescoberto em uma época que clama por um maior contato com a leitura e, principalmente, com o pensamento crítico.